sábado, 23 de agosto de 2008

Eternamente "tios"

Um dia desses saí pra caminhar e passei enfrente a um dos colégios que freqüentei. Era final de turno e quando alguns funcionários passaram por mim, reconheci dentre eles um a quem carinhosamente nos referíamos como o tio da portaria. Sebastião o nome dele, sempre que eu o cumprimentava, balançava a cabeça em sinal afirmativo e dizia “tudo bem Naiara”. Fiquei feliz em revê-lo. Acredito que esses tios não têm idéia de como são importantes na nossa vida...
Lembrei da tia Justina, e dos tantos papos que a gente batia no portão da escola esperando alguém me buscar. Era bom saber que tinham adultos legais, e engraçado que em 90% dos casos, esses eram os tios.
E o Ataíde? Esse era o guarda de uma outra escola. Eu devia estar na 2ª série primária e todos os dias depois da aula a gente ia jogar vôlei, queimada ou futebol. Ele era o nosso juiz permanente, nenhum jogo começava se ele não estivesse lá pra comandar. Até arrumou um apito. Quantas crianças você conhece que imploram para adultos “se meterem” em seus jogos? E quantos adultos você conhece dispostos a, todos os dias e muitas vezes depois do horário, apitar brincadeira de moleque?
Depois me lembro de quantas vezes vi crianças pequenas gritando com esses nossos tios... Não posso entender... Grande parte da minha formação se deu em razão dessas pessoas, sempre ali de bom humor! Nem eram eles que te davam dever de casa, te expulsavam de sala ou chamavam seus pais para conversar! Alô! Eles são os adultos legais! Desvalorizados, que ficavam cuidando da gente enquanto ninguém vinha buscar, levando pra “salinha” e ainda correndo atrás dos mais danados, pra no outro dia ainda ouvir de relance: “Vocês não vão acreditar! Ontem eu fui embora pra casa e a tia Conceição não me pegou!” Eles eram definitivamente os únicos adultos legais do planeta. Quantas vezes nos ajudavam a esconder, ou davam gargalhadas das nossas piadinhas sem graça? E ainda te chamavam pelo nome e sorriam sempre que te viam.
Cícero era o nome do tio da cantina que me deixava comprar fiado. Só eu tinha esse privilégio, porque um dia ele me deu R$0,50 a mais e eu devolvi. Ele me ensinou que através da honestidade a gente pode conquistar confiança e amizade.
E as tias da limpeza? Me lembro bem de uma ruiva, nunca soube o nome dela, mas lembro que estava sempre de cabeça baixa. Um dia resolvi dar “bom dia”, ao que ela respondeu com um sorriso. Desde aí nunca mais a vi olhando pra baixo, ela sempre me via quando eu passava e sorria. Faz pouco tempo a encontrei no ponto de ônibus. Eu cresci, tracei meus caminhos e agora tenho meus próprios interesses, preocupações e responsabilidades... Nada disso fez diferença alguma pra ela, porque não só me reconheceu como sorriu da mesma maneira de antes. E fez mais, quis saber como eu estava e o que na minha vida havia mudado. Ela me ensinou que amizades podem ser simples, desde que sejam sinceras. Como meu “bom dia” e o sorriso dela.
Consegue contar quantas vezes um bedel livrou sua cara? Me lembro sempre do tio Ribas, acho que ele era o favorito do pessoal. Teve muita revolta na escola quando ele foi embora... Não dá pra esquecer também do Alan, que a gente acreditava ser possuidor de uma bola de cristal. Era incrível como ele sempre estava no lugar e na hora certas pra pegar alguém em flagrante. A gente se divertia fantasiando a quantidade de clones que ele devia ter rodando pelo colégio... Fora o Zequinha, que foi tombado (literalmente), pelos meninos como patrimônio de outro dos tantos colégios por onde passei.
Esses tios foram especiais pra mim, e pode acreditar, pra muitos dos meus amigos também. Nos ensinaram em sua simplicidade, muitos dos princípios que hoje guiam nossa vida por um mundo sem valores. São eles que ficam gravados na nossa memória e são os primeiros a serem reconhecidos quando encontrados no decorrer da vida. Junto com a professora da 4ª série e aquele outro de inglês do 2º grau, eles têm um lugar especial no nosso coração. Tente se lembrar dos seus tios e procure perceber quantas coisas essenciais aprendeu com eles. Ainda vai deixar seus filhos maltratarem a tia que cuida da sua casa?

Morena – mar/06

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