sábado, 23 de agosto de 2008
Ciranda de fogo
Não se importou muito com o que haveria de fazer. Por que deveria?
A aula de piano terminara um pouco mais cedo, ela fechou os cadernos e se despediu da professora. Nem bem encontrou a porta, desligou o celular e respirou fundo. Olhou o parquinho à sua frente e pensou nos filhos que a essa hora deviam estar em alguma das tantas atividades que praticavam.
Sentou-se no banco e ficou observando as babás conversarem enquanto as crianças brincavam. O calor suave tornava o ambiente mais agradável ainda... Pensou no tempo que perdera longe de seus próprios filhos, sempre aos cuidados de babás...
Viu o motorista chegar e virou-se de costas. Não lhe devia satisfações. Afundou-se no banco e deixou-se estar por mais algum tempo, tirou o salto e tocou com seus delicados pés a areia fina...
Fechou os olhos e passou apenas a ouvir o barulho dos carros ao longe e os gritinhos alegres dos meninos. Sem os abrir, tirou o celular da bolsa e deixou-o cair no chão enterrando-o com os pés. Parece-me ter cochilado...
Quando lentamente abriu os olhos, viu uma árvore alta bem a sua frente, na qual não havia reparado ainda... Era um estrondoso pé de manga ainda carregado. Pensou nas crianças de sua época. Nunca encontraria um pé carregado em plena estação, mesmo naquela área da cidade. Neste momento, sentiu penetrar por seus pulmões um quê de aventura, um desejo pelo perigo que nunca antes aquele corpo experimentara...
Quando deu por si, estava sentada e meio às folhagens descascando a fruta com os dentes e soltou uma deliciosa gargalhada. Ao virar-se para obter outra, sentiu que a calça bem passada com vinco lhe impedia tais movimentos. Então percebeu suas mãos de unhas bem feitas pintadas de vermelho escarlate, onde a pele já não era mais tão rígida. Era a primeira vez que teve tempo de notar o quanto envelhecera. Bateu no bolsos a procura de um espelho, mas só pode encontrar o rico medalhão que trazia ao pescoço e deixou-se mirar por alguns instantes... Quem seria aquela senhora? Novamente soltou uma gargalhada. Dessa vez no entanto, se diria que foi um tanto sinistra...
Limpou as lágrimas que se ajuntavam em seus olhos a convite do riso e jogou longe o medalhão. Sentia-se livre e algo lhe dizia até que poderia voar se apenas o desejasse. Não o fez. Apenas recostou-se numa galha que lhe passava às costas e esteve a ver desenhos nas nuvens enquanto balançava as pernas despreocupadamente.
Não sei dizer quanto tempo esteve assim, apenas sei que viu o mais belo entardecer de sua vida e esteve ainda a contar estrelas por um longo espaço de tempo. Poderia, inclusive, estar ali para sempre! Não fosse uma luz repentina ter chamado sua atenção. Olhou para baixo e seus olhos brilharam ao ver lindas labaredas de fogo a contornar a figura de uma jovem.
Mal tocara os pés no chão, pôde sentir o calor do fogo a queimar-lhe a alma. Fechou os olhos numa piscada longa e logo quando os abriu viu, a menos de um metro de si, a menina com tochas de fogo sorrindo-lhe gentilmente.
Sem nada dizer, conduziu-lhe pela mão até o meio de uma roda onde haviam outras meninas que assim como a primeira, giravam bastões ou jogavam suas claves flamejantes. Como que brincando de roda, faziam belas figuras a sua volta e vez por outra cuspiam enormes labaredas de fogo esquentando seu corpo por todos os lados ao mesmo tempo.
Esteve a girar como bailarina, como a muito tempo não fazia... Tocou a ponta do pé com uma das mãos enquanto a outra permanecia esticada para o alto. Levantou-se graciosamente nas pontas dos pés e saltou leve, bela, como só ela soubera fazer em seu tempo.
As meninas lhe sorriam e pareciam possuir olhos de gato que brilhavam durante a dança. Nunca nada lhe parecera tão gostoso, e essa sensação se misturava com o calor das chamas e com o sopro gélido do vento entre uma e outra nota.
A ciranda se locomovia como um tufão, mas seu caminhar era ritmado por uma melodia surda que sentia envolver-lhe desde a sola dos pés descalços até a ponta de seus cabelos tingidos...
E a roda foi se afastando cada vez mais, sem perder o ritmo ou alterar o compasso até que não se podia ver nem sentir mais nada...
Não sei dizer para onde foi, ou o que se deu àquela rica senhora... Apenas cabe a mim dizer que sua alma estava em paz.
Morena - mai/06
Detalhes
Era ele mesmo. O mesmo de sempre. Comprido e delgado. O mesmo cara apagado. Interessante, sem dúvida, mas apagado. Talvez fosse preciso mudar algo... Um corte de cabelo, alguns quilos, quem sabe? Ele não chamava sequer a atenção dela, justo ela que sempre esteve ali. Ao menos era nisso que acreditava.
Esperava que seu reflexo pudesse lhe dizer algo, mas não dizia. Deixou-se estar por alguns momentos e decidiu mudar. Porque Tudo na vida parte de uma decisão. Daquele momento em diante, ele se tornaria outro, sem medo de enfrentar as conseqüências. Nem ela se importava mais! Nem ela! Quem então se importaria?
Tudo começou naquela viagem. Decidiu ser bonito e ficou. Decidiu chamar a atenção. Chamou. Decidiu dançar. Não dançou. Nem sempre decidir é suficiente não?! Mas garanto que é sempre o começo.
Sentia-se como se o mundo fosse coberto de detalhes e nada realmente importasse, a não ser aquele momento, naquela viagem. Se não sabia dançar, pouco importava, porque podia aprender. Se não podia engordar, também não importava porque se faria chamar a atenção mesmo assim. Detalhes, detalhes... Por que se importar?
De repente ela também parecia ser um detalhe em sua mente... Um mero enfeite que lhe consumira a alma por 4 longos anos. Só um detalhe. É certo que não deixara de ser bonito e que podia como ninguém ornamentar seus pensamentos. Mas... era um detalhe! E ele sem dúvida estava disposto a tirá-lo da parede de seu coração, já que traria àquele lugar cores vivas! Vermelho sangue, azul turquesa, amarelo gema. Precisava de mais cores, e talvez um enfeite maior, mais pulsante, como tudo em sua nova vida estava disposto a ser...
Encontrou o enfeite perfeito. Mais mulher, mais chamativa, mais atraente. Não estava certo disso tudo ainda, mas gostaria de senti-la assim. Sem, todavia, mostrar empolgação, ou o desespero de quem acha exatamente o que procura na última peça da última loja do corredor. Saberia chegar perto dela? Conhecê-la e chamar sua atenção da mesma forma que ela chamava a dele? Hum... O que poderia perder? Estava aprendendo a lidar com suas novas armas e estava muito ansioso para descobrir o poder que elas teriam.
Fim da viagem, mas apenas o começo daquele jogo que ele pretendia jogar com calma e maestria... Tornou-se ousado. Finalmente entendera que não tinha Nada a perder. Não colocou sua auto-confiança sobre a mesa como anteriormente. Sentia que tinha aprendido a jogar, e suas armas de agora, muito mais poderosas que as de antes, porque ele não economizava, mas utilizava a Todas.
Voltou para casa com uma certeza: aquele belo e lustroso enfeite estaria em breve ajudando a compor uma de suas paredes. Não esperava, no entanto, que pudesse ser conquistado por seus encantos, e se deixar afundar no canto de uma ardente sereia. Parece não ter percebido que esse era um jogo de pergunta E resposta.
Trocou o guarda-roupa, tirou todo o preto de outrora e nomeou-se Estilo. Deveria, portanto, ter um visual condizente. Fazia-o devagar, mas pensando rápido e o reflexo no espelho finalmente pôde dizer-lhe algo. Sorria para ele e ele se sentia confiante.
Morena - mar/06
Ele, ela, às vezes eu
Mas... o que seria do amor sem os conflitos? Sem a sensação de proibido, escondido... sem suor, nervosismo, esconderijo... sem dar tudo errado? Pode alguém amar com toda a sua alma, pode alguém se entregar tão completamente a uma pessoa que sempre esteve passivamente ali?
Ela se revirava na cama e não podia dormir. Tinha dito tudo. Nada mudou. Se entregara completa, todos os seus sonhos, desejos, expectativas, vontades... Tudo em suas mãos, exceto um deles. Era uma promessa feita a outrem, não a podia entregar. Seria ele tão incompreensível e egoísta que não podia “emprestá-la” por aquele curto espaço de tempo? Seria aquele, tanto tempo assim?
Ele não disse que não podia. Ela entendeu assim mesmo. Foi pra cama triste, nem se deu conta que o dia ainda não tinha acabado. Estava decidido, e ele assim o fez. Acabado, pela primeira vez claro como que iluminado pelo foco de inúmeras velas. Seu peito descansou no colchão fino e procurou assim mesmo sorrir. Todo o possível havia sido feito.
No outro dia uma surpresa. TODOS sabiam o quanto ele ficara abalado com suas palavras. TODOS sabiam que elas, de alguma maneira, penetraram aquela fria superfície e ao menos ligeiramente tocaram um coração trancafiado em uma masmorra de ânsias e temores.
Podia aceitar a rejeição. Podia, e estava pronta a fazê-lo. Mas não a covardia... Essa não. Porque enfrentara todos os seus fantasmas, ou acaso se pensaria não ser ela assombrada por tantos deles? Mas enfrentara. Combateu seu orgulho e reuniu toda a pouca humildade que a duras penas sobrevivia em seu âmago, subiu bem alto e venceu-os.
“Você não tá entendendo quase nada do que eu digo...
Eu quero que você venha comigo!”
Há quem diga que ela saltou de um penhasco, agora não tinha mais volta. Assim, também ela definiria quando percebesse que lhe faltara o chão. O microfone escorregando por entre seus dedos e as pernas tremendo tanto que a qualquer momento não mais resistiriam. Só porque ele a via e se ela fazia algo, era pra ele! O presente teria sido melhor se o tivesse conseguido afinar...
Lágrimas não lhe quiseram descer pela face. Cobriu-se dos pés a cabeça. Por que só ela não sabia? Por que ele não vinha dizer-lhe? E o sono cada vez mais se afastava daquele quarto. Esperaria saber a resposta? Perguntaria outra vez? Não. O que havia para ser dito, foi dito. E finalmente pôde dormir... Não se sabe se de resolução ou cansaço.
Que fazer? Esperou. Viu-o. Tremeu. Nada... não lhe podia dizer nada. Seus pensamentos se chocavam na cabeça. Como? Não tem nada a me dizer? Pode contar a TODOS e me deixar sem saber? Não te preocupa me perder? Não lhe custaria nada nesse andar da carruagem...
Esperou mais. Via um gol preto, duas portas, parado na frente de casa todos os dias quando chegava. Gostava de pensar que abriria a porta e lá estaria ele, sentado no sofá, esperando para lhe dizer que não queria ficar sem ela, e que aceitaria seus sonhos e compreenderia o único que lhe não podia entregar. Que a não esperaria, pela passividade que a palavra remete, mas que se prepararia para que seu encontro no futuro pudesse então definir como todo o resto seria. Ha ha ha ha ha ha.... só podia rir mesmo... no dia que encontrasse alguém, homem suficiente para sozinho decidir ser o “pêgo” desse pique-esconde onde o coração e a razão não conseguem brincar juntos, podia ter certeza de que era uma mulher travestida. Homem não percebe essas coisas. Não entende que muitas vezes a gente termina sem querer terminar, que vai embora querendo ser seguida, que fica furiosa, mas não quer ser ouvida nem receber desculpas. Quer só um beijo com gosto de “putz! Você fica linda quando está brava” que te rouba as palavras da boca e te faz sentir desejada, protegida... te faz sentir mulher! Porque por mais segura que a gente seja, ainda somos frágeis. Feminismo de queimar sutiã é feminismo burro. Não quero ser tratada que nem homem, não quero carregar peso e nem ganhar tapa nas costas quando for cumprimentar alguém. Só quero ser valorizada pelas minhas capacidades e receber elogios de um cara que sabe “pegar” e beijos que vão me fazer sentir requisitada. Porque “homem sensível” é aquele que procura entender a gente, não ser igual à gente.
Sente que já esperou demais... “O que você não pode decidir em um dia, você não pode decidir...” e ela não sabe viver com gente fraca. Quem desiste de sonhos por medo não merece o tempo dela. Parece que usou toda a humildade que tinha para dizer a ele o que sentia...
Pára enfrente ao espelho com uma tesoura na mão. Deixa-se focar por alguns instantes... Junta todo o cabelo num rabo de cavalo e passa a lâmina bem rente à cabeça. Repete o feito mais duas ou três vezes. Novamente deixa-se mirar no espelho. Não se sente mais bonita, e nem o procura. Apenas se sente nova e está pronta para se fazer nova. Mas sabe que não vai ser suficiente.
Morena - mar/06
Ela se revirava na cama e não podia dormir. Tinha dito tudo. Nada mudou. Se entregara completa, todos os seus sonhos, desejos, expectativas, vontades... Tudo em suas mãos, exceto um deles. Era uma promessa feita a outrem, não a podia entregar. Seria ele tão incompreensível e egoísta que não podia “emprestá-la” por aquele curto espaço de tempo? Seria aquele, tanto tempo assim?
Ele não disse que não podia. Ela entendeu assim mesmo. Foi pra cama triste, nem se deu conta que o dia ainda não tinha acabado. Estava decidido, e ele assim o fez. Acabado, pela primeira vez claro como que iluminado pelo foco de inúmeras velas. Seu peito descansou no colchão fino e procurou assim mesmo sorrir. Todo o possível havia sido feito.
No outro dia uma surpresa. TODOS sabiam o quanto ele ficara abalado com suas palavras. TODOS sabiam que elas, de alguma maneira, penetraram aquela fria superfície e ao menos ligeiramente tocaram um coração trancafiado em uma masmorra de ânsias e temores.
Podia aceitar a rejeição. Podia, e estava pronta a fazê-lo. Mas não a covardia... Essa não. Porque enfrentara todos os seus fantasmas, ou acaso se pensaria não ser ela assombrada por tantos deles? Mas enfrentara. Combateu seu orgulho e reuniu toda a pouca humildade que a duras penas sobrevivia em seu âmago, subiu bem alto e venceu-os.
“Você não tá entendendo quase nada do que eu digo...
Eu quero que você venha comigo!”
Há quem diga que ela saltou de um penhasco, agora não tinha mais volta. Assim, também ela definiria quando percebesse que lhe faltara o chão. O microfone escorregando por entre seus dedos e as pernas tremendo tanto que a qualquer momento não mais resistiriam. Só porque ele a via e se ela fazia algo, era pra ele! O presente teria sido melhor se o tivesse conseguido afinar...
Lágrimas não lhe quiseram descer pela face. Cobriu-se dos pés a cabeça. Por que só ela não sabia? Por que ele não vinha dizer-lhe? E o sono cada vez mais se afastava daquele quarto. Esperaria saber a resposta? Perguntaria outra vez? Não. O que havia para ser dito, foi dito. E finalmente pôde dormir... Não se sabe se de resolução ou cansaço.
Que fazer? Esperou. Viu-o. Tremeu. Nada... não lhe podia dizer nada. Seus pensamentos se chocavam na cabeça. Como? Não tem nada a me dizer? Pode contar a TODOS e me deixar sem saber? Não te preocupa me perder? Não lhe custaria nada nesse andar da carruagem...
Esperou mais. Via um gol preto, duas portas, parado na frente de casa todos os dias quando chegava. Gostava de pensar que abriria a porta e lá estaria ele, sentado no sofá, esperando para lhe dizer que não queria ficar sem ela, e que aceitaria seus sonhos e compreenderia o único que lhe não podia entregar. Que a não esperaria, pela passividade que a palavra remete, mas que se prepararia para que seu encontro no futuro pudesse então definir como todo o resto seria. Ha ha ha ha ha ha.... só podia rir mesmo... no dia que encontrasse alguém, homem suficiente para sozinho decidir ser o “pêgo” desse pique-esconde onde o coração e a razão não conseguem brincar juntos, podia ter certeza de que era uma mulher travestida. Homem não percebe essas coisas. Não entende que muitas vezes a gente termina sem querer terminar, que vai embora querendo ser seguida, que fica furiosa, mas não quer ser ouvida nem receber desculpas. Quer só um beijo com gosto de “putz! Você fica linda quando está brava” que te rouba as palavras da boca e te faz sentir desejada, protegida... te faz sentir mulher! Porque por mais segura que a gente seja, ainda somos frágeis. Feminismo de queimar sutiã é feminismo burro. Não quero ser tratada que nem homem, não quero carregar peso e nem ganhar tapa nas costas quando for cumprimentar alguém. Só quero ser valorizada pelas minhas capacidades e receber elogios de um cara que sabe “pegar” e beijos que vão me fazer sentir requisitada. Porque “homem sensível” é aquele que procura entender a gente, não ser igual à gente.
Sente que já esperou demais... “O que você não pode decidir em um dia, você não pode decidir...” e ela não sabe viver com gente fraca. Quem desiste de sonhos por medo não merece o tempo dela. Parece que usou toda a humildade que tinha para dizer a ele o que sentia...
Pára enfrente ao espelho com uma tesoura na mão. Deixa-se focar por alguns instantes... Junta todo o cabelo num rabo de cavalo e passa a lâmina bem rente à cabeça. Repete o feito mais duas ou três vezes. Novamente deixa-se mirar no espelho. Não se sente mais bonita, e nem o procura. Apenas se sente nova e está pronta para se fazer nova. Mas sabe que não vai ser suficiente.
Morena - mar/06
Mocinhas e Bandidos
Restava apenas um pequeno fio de vida... E onde está ele para salvar a mocinha do grande e temido fantasma do desânimo? Desesperada, ela já sucumbe às garras deste monstro implacável.
Mas ele chega! Num pangaré suado ao meio-dia num sol de fritar os miolos. Não se sabe qual o mais magro, se o cavalo ou o cavaleiro... O fato é que chega, ele, o príncipe do sertão! Calçado em suas sandálias de couro queimado, empunhado de sua peixeira sem corte e toda a sua determinação, lá estava o homem que viria salvar Joaninha e, quem diria, seria o grande e único amor de sua vida.
A essas alturas, Joaninha estava no tanque esfregando mais uma muda de roupa que conseguira pra lavar. Havia pouco trabalho a se fazer ali, a quantidade de lavadeiras era muito maior que a de madames para procurar o serviço. Já fazia três dias que o Zé tinha saído e não chegava trazendo comida para os dois. A situação estava difícil para todo mundo e o Zé sempre aprontando... Até que beber o desgraçado não bebia, mas sempre voltava para casa sem dinheiro.
Ao perceber que era ele quem se aproximava rapidamente por cima das pedras, um sorriso surgiu espontâneo nos lábios de Joaninha. Que saudade! Mas ela, que não era boba e conhecia bem o marido que tinha, logo levantou a sobrancelha direita e ficou desconfiada com o possível motivo de toda aquela alegria. Ele, que também conhecia muito bem a patroa, não deu espaço para perguntas e tratou de logo carimbar-lhe um beijo molhado na boca pequena, que sabia que só nessa rudeza apaixonada podia amansar a oncinha de um metro e meio que chamava mulher.
- Oxe Zé! E faz assim na frente de todo mundo agora é?
- É pra mostrá pra quem quisé vê que essa neguinha aqui é minha!
- Pare com isso vá!... E agora me conte o que é que assucedeu nesse tempo todinho que ficô fora. E trôxe comida?
- Oxente, claro neguinha! E pensa que seu calanguim ia lhe dexá morrê de fome?
Joaninha mal podia acreditar no que seus olhos viam. Ele saíra com quase todo o dinheiro que tinham para procurar trabalho e comida. Agora volta com um saquinho de arroz e outro de feijão que não iam durar três dias.
- Ai minha Nossa Senhora, meu Padim Padi Cícero! Zé, cadê o resto do dinheiro? Essa comida aqui, caba depois da manhã!
- Neguinha... cê nem vai consegui creditá no que eu vou te contá...
A animação do Zé não consola nem um pouco Joaninha que já começa a chorar antes mesmo que ele diga alguma coisa. Depois de alguns minutos de rodeio, finalmente ele solta a bomba:
- Neguinha, a gente tá indo pra Brasília! Eu dei o resto do dinhero pra pagar nossa passage que o moço me vendeu bem baratim!
Foi demais para ela. Seu corpo amolecido só não encontrou o chão de maneira brutal porque, afinal de contas, essa história tem mocinho! Mas e a barriga? O Vicente ia chegar em três meses! Podia ela fazer viagem tão longa naquele estado? O Zé ficou doido de vez! Só podia...
- Intão fala pro seu filho que ele vai sê lixêro! Ou que vai prantá o dia todo, vai chegá em casa e num vai tê o que comê! ... Neguinha, essa é a nossa chance de levá nosso minino pra iscola, de educá ele! Pra quando nóis ficá véio ele podê cuidá de nóis também...
Joaninha chorou a noite toda. O Zé tava certo... No mais, podia ela vê-lo partir e ficar? Não, não podia. Nem ele o faria. E as passagens? Já estavam pagas e tudo o que ela queria era o melhor pro Vicente.
Nessa hora, nossa mocinha abriu a porta de casa e, de súbito, foi raptada por uma centelha de esperança.
Morena - mar/06
Agosto
Era uma tarde agradável, fins de agosto e ele me chamara para um almoço caseiro.
Desci do ônibus, demorei a vê-lo... Mas estava lá, de bermuda e chinelo, como o vira em poucas ocasiões. Me deu um abraço gostoso, firme e me olhou com carinho. Me senti feliz.
Andamos um pouco por uma rua estreita entre casas arborizadas. Era a primeira vez que almoçava na casa dele, estava até um pouco nervosa... a gente nem namorava mais, pensava estar perdida em algum canto do passado dele. Mas não estava.
Me tratou como princesa, escolheu a melhor cadeira e me deixou a ver fotos enquanto afobado, preparava a comida. Mas me testou, uma prova fácil: temperei o tomate.
Me olhou ansioso na primeira garfada... estava ótimo! Até repeti, pra ver se seus olhos confiavam na aprovação do meu paladar.
Foi tomar banho. Sequei a louça, guardei os pratos e organizei as panelas. Passou de toalha, não achava que eu ia ver. Arregalou os olhos, morreu de vergonha e correu para o quarto na ponta dos pés. Tive vontade de rir. Tão lindo! Certifiquei-me de estar em outro lugar quando ele passasse novamente.
Voltou para a cozinha cheiroso, só vendo. Sorriu, sentou numa cadeira de braço e abriu o álbum de fotos. Cheguei perto e ele me segurou. Sentei no braço da cadeira de frente para ele e ele me olhou daquele jeito, aquele que não dá pra explicar...
Abaixou a cabeça e envolveu minha cintura com os braços. E ficou assim, sem dizer uma palavra, só ronronando como um gatinho.
Deslizei os dedos por entre seus cabelos molhados, olhei em volta: a pia limpa, os pratos empilhados, as fotos esquecidas, a panela ainda quente em cima fogão.
Fechei os olhos. Senti o cabelo dele molhar minha blusa. Pensei no bebê que ele tentaria ouvir. Meus olhos se encheram d’água.
Morena - 2003
Janelas da Alma
Existe um documentário brasileiro intitulado “Janela da Alma”. Lembro-me de tê-lo assistido há alguns anos atrás num festival de cinema brasileiro e de ter ficado encantada, mas estava tão cansada que não pude captar a essência do filme da maneira que gostaria.
Hoje, resolvi vê-lo novamente e foi interessante como o mesmo filme me afetou de maneira tão diferente. Quais são as janelas da alma? São os olhos... mas e as pessoas que não podem usá-los? Elas também podem ver. Muitas vezes muito mais que nós, possuidores de uma visão privilegiada.
O filme trata essa percepção da alma como algo intrinsecamente ligado aos sentimentos e como não seriam? Assim foi comigo a sensação de ver o mesmo filme anos depois. Quem disse que as coisas são do jeito que as vemos? E quem falou que as vemos todas iguais? O que eu vejo e chamo vermelho pode ser completamente diferente do que você vê e dá o mesmo nome. Foi assim quando coloquei óculos pela primeira vez: de repente o mundo parecia um desenho animado onde tudo era tão nítido como que contornado por uma linha preta... Não gostei. Prefiro olhar para o céu e não saber exatamente onde a lua termina e onde começa sua aura.
Outro fato que me chamou bastante a atenção, para não dizer que me deixou em estado de choque, foi a declaração de uma cineasta que culpou pelo fracasso de sua carreira de atriz o fato de ser “vesga”. Disse que nunca adquiriu os melhores papéis e nunca pôde ser a “princesinha” da peça porque era vesga. O mais interessante é que depois de adulta ela se submeteu a uma série de cirurgias e conseguiu finalmente “alinhar” seu olhar. Agora, ela possuía a capacidade de olhar nos olhos de alguém e esse alguém se sentir fitado. Só que ninguém percebeu. Ninguém percebeu! As deformidades são mentais.
A gente pode perceber isso no próprio dia-a-dia quando, por exemplo, num dia especial, você levanta alegre e as pessoas dizem que você está mais bonita naquela manhã. Tenho um amigo com uma teoria interessante de que existem épocas na vida que você está tão sozinho e ninguém olha para você a ponto de te fazer sentir “inestuprável”. Então é só aparecer alguém e você começar a namorar que de repente todo mundo acha você uma pessoa interessante. Sou obrigada a concordar, mas para mim, esse fenômeno está longe de ser explicado por Murphy. Se você se considera um ser inestuprável, provavelmente vai ser, porque a energia que temos dentro de nós mesmos é muito forte e o motivo que damos aos nossos fracassos vão nos fazer fracassar e na maioria das vezes as pessoas ficarão surpresas com a ocorrência desses fracassos. As deformidades são mentais.
“Portanto, plante seu jardim e decore sua alma, ao invés de esperar que alguém lhe traga flores.
E você aprende que realmente pode suportar... que realmente é forte, e que pode ir mais longe, depois de pensar que não pode mais. E que realmente a vida tem valor e que você tem valor diante da vida.” William Shakespeare
Morena - jun/06
Renascer para uma vida sem reflexo
Na qualidade de monitora de literatura portuguesa – romantismo, é de minha responsabilidade substituir a professora em uma ou outra ocasião que precise se ausentar.
Pois bem, essa semana ela não virá e hoje foi a primeira aula que ministrei em seu lugar.
Falamos de contos fantásticos e de alguns pontos que me são de especial interesse, como a questão do duplo. Analisamos “O Homem da Areia” de ETA Hoffmann, em que o personagem principal se apaixona perdidamente por uma “boneca de madeira”. Segundo ele, ela é a ouvinte perfeita, que não se distrai e que compreende-o no âmago de seu ser. Natanael não consegue perceber que sua amada não passa de um “autômato sem vida”.
Discutimos a respeito de nossas vidas e do espelho que freqüentemente procuramos em nossos relacionamentos. Olímpia não passava de uma boneca, mas nela, Natanael se via refletido por inteiro. Ela nada dizia, apenas suspirava, e nesse suspiro Natanael sentia-se completo. Porque não procuramos no outro suas próprias características. Procuramos o que convenientemente chamamos “afinidade” mas que nada mais é que nosso reflexo.
Naquele momento quis que alguém especial participasse da discussão...
É inevitável sentir-se extremamente egoísta ao dar-se conta de que procuramos pessoas que ecoem nossa alma em detrimento daquelas que, em suas diferenças, tenham algo a acrescentar a nossas vidas. Amamos o espelho. Amamos o desejo de posse.
Marx transfere essas relações ao capitalismo quando diz que não compramos mercadorias e sim o desejo de obtê-las. Muitas vezes são bens supérfluos e tão desnecessários que vão parar no canto do quarto, esquecidos e sem uso.
Discutimos também o amor que Natanael nutria por Clara antes de conhecer Olímpia. Note que o termo utilizado foi “nutrir” e não “sentir”, porque acredito no amor como objeto que se desenvolve conforme nutrido. Sentir o amor dá um tom de passividade ao sujeito. “Amor passivo” me soa por demais antagônico.
Em fim, Natanael é um personagem pesado, sombrio, confuso, dramático e apaixonado. Clara é o ser amado desde a tenra infância, a transparência, pureza, inocência e racionalidade também amante de seu oposto. Parece-me prova de que o ser humano se completa em outro que seja exatamente seu contrário, até que Narciso grite em nosso peito e nos conduza a procura do autômato, réplica fracassada do próprio ser.
Mais uma vez quis que alguém estivesse presente: ele, o meu lado racional...
Natanael volta a sua Clara depois de ver Olímpia sem olhos e desajeitadamente carregada sobre os ombros de um de seus criadores. Volta para Clara, mas não sem antes passar dias internado. Só que existe um porém nisso tudo, Natanael não pode mais viver naquele mundo. Ele não se encaixa. Nunca se encaixou. E ao menor sinal remetente àquele passado “artificial”, ele perde o controle de si mesmo, quase mata Clara e se mata.
Um não pode viver sem o outro e os dois são necessários para o equilíbrio. O “espelho” fica entre os dois, de forma que Natanael não pode mais ver Clara. Ele só pode enxergar seu próprio reflexo e sua própria loucura.
Será que todos temos alguém que nos completa? Platão descreve em “O Banquete”, o mito do Andrógeno, seres que eram superiores aos homens e às mulheres, que por desafiarem Zeus, são castigados e repartidos ao meio. Seu destino é vagar sobre a Terra na eterna busca de sua “alma gêmea”.
Não acredito em romances tão perfeitos ou em pares tão hermeticamente fechados em si, mas acredito que um primeiro passo para todo ser humano é sair da frente do espelho. Para todos nós, natanaéis das artes, existem claras, puras e racionais, para dar vazão a esses furacões de sentimento.
De repente me sinto impulsionada a buscá-lo na engenharia e finalmente tê-lo em minha discussão...
Morena – mai/06
Pois bem, essa semana ela não virá e hoje foi a primeira aula que ministrei em seu lugar.
Falamos de contos fantásticos e de alguns pontos que me são de especial interesse, como a questão do duplo. Analisamos “O Homem da Areia” de ETA Hoffmann, em que o personagem principal se apaixona perdidamente por uma “boneca de madeira”. Segundo ele, ela é a ouvinte perfeita, que não se distrai e que compreende-o no âmago de seu ser. Natanael não consegue perceber que sua amada não passa de um “autômato sem vida”.
Discutimos a respeito de nossas vidas e do espelho que freqüentemente procuramos em nossos relacionamentos. Olímpia não passava de uma boneca, mas nela, Natanael se via refletido por inteiro. Ela nada dizia, apenas suspirava, e nesse suspiro Natanael sentia-se completo. Porque não procuramos no outro suas próprias características. Procuramos o que convenientemente chamamos “afinidade” mas que nada mais é que nosso reflexo.
Naquele momento quis que alguém especial participasse da discussão...
É inevitável sentir-se extremamente egoísta ao dar-se conta de que procuramos pessoas que ecoem nossa alma em detrimento daquelas que, em suas diferenças, tenham algo a acrescentar a nossas vidas. Amamos o espelho. Amamos o desejo de posse.
Marx transfere essas relações ao capitalismo quando diz que não compramos mercadorias e sim o desejo de obtê-las. Muitas vezes são bens supérfluos e tão desnecessários que vão parar no canto do quarto, esquecidos e sem uso.
Discutimos também o amor que Natanael nutria por Clara antes de conhecer Olímpia. Note que o termo utilizado foi “nutrir” e não “sentir”, porque acredito no amor como objeto que se desenvolve conforme nutrido. Sentir o amor dá um tom de passividade ao sujeito. “Amor passivo” me soa por demais antagônico.
Em fim, Natanael é um personagem pesado, sombrio, confuso, dramático e apaixonado. Clara é o ser amado desde a tenra infância, a transparência, pureza, inocência e racionalidade também amante de seu oposto. Parece-me prova de que o ser humano se completa em outro que seja exatamente seu contrário, até que Narciso grite em nosso peito e nos conduza a procura do autômato, réplica fracassada do próprio ser.
Mais uma vez quis que alguém estivesse presente: ele, o meu lado racional...
Natanael volta a sua Clara depois de ver Olímpia sem olhos e desajeitadamente carregada sobre os ombros de um de seus criadores. Volta para Clara, mas não sem antes passar dias internado. Só que existe um porém nisso tudo, Natanael não pode mais viver naquele mundo. Ele não se encaixa. Nunca se encaixou. E ao menor sinal remetente àquele passado “artificial”, ele perde o controle de si mesmo, quase mata Clara e se mata.
Um não pode viver sem o outro e os dois são necessários para o equilíbrio. O “espelho” fica entre os dois, de forma que Natanael não pode mais ver Clara. Ele só pode enxergar seu próprio reflexo e sua própria loucura.
Será que todos temos alguém que nos completa? Platão descreve em “O Banquete”, o mito do Andrógeno, seres que eram superiores aos homens e às mulheres, que por desafiarem Zeus, são castigados e repartidos ao meio. Seu destino é vagar sobre a Terra na eterna busca de sua “alma gêmea”.
Não acredito em romances tão perfeitos ou em pares tão hermeticamente fechados em si, mas acredito que um primeiro passo para todo ser humano é sair da frente do espelho. Para todos nós, natanaéis das artes, existem claras, puras e racionais, para dar vazão a esses furacões de sentimento.
De repente me sinto impulsionada a buscá-lo na engenharia e finalmente tê-lo em minha discussão...
Morena – mai/06
"Quanto vale o seu sonho?"
Interessante que às vezes a gente toma umas decisões na vida e nem a gente mesmo sabe porque...
Interessante que muitas vezes a gente fica tão vidrado naquilo que não dá espaço para mais nada acontecer...
Interessante também que a gente passa a vida toda fazendo tantos planos e juntando os centavos do salário para aquele dia que nunca chega. “Quanto vale o seu sonho?” Me perguntou um professor de administração financeira.
Quanto vale o Seu sonho?
Para o Francisco, valeu a safra do ano num acordeom e um violão para os dois filhos. Depois valeu o salário de um mês em fichas telefônicas pedindo “É o amor” na rádio local. Fora tantos outros sacrifícios esquecidos pelo caminho.
Para algumas pessoas vale passar anos sem tirar férias, depois fazer um cruzeiro pelo mundo... Já pensou?
Para uma amiga minha valeu ficar um ano quase sem sair fim de semana e passar lua de mel em Paris... Chique né?!
Fico pensando quanto meu sonho vale...
“Você tem que saber que eu quero é correr mundo, correr perigo;
Eu quero é ir-me embora, eu quero é dar o fora!”
Meu sonho é conhecer o mundo, falar mais de 5 idiomas, cantar, cantar, cantar e cantar...
Quanto vale o seu sonho? Será que vale arriscar?
Acredito que a maioria dos sonhos está bem perto de nós... O preço é arriscar, sempre acreditamos que eles estão a apenas um passo da loucura ou do fracasso e acabamos por não trilhá-lo, porque é melhor sonhar do que fracassar. Mas será que é melhor do que tentar? Como dizem por aí “Se tudo der errado, vire hippie!” hehehe
Gosto muito de uma frase que a mulher de Francisco diz:
“Que sonho? Eu criei meus filhos foi acordada.”
Acredito que é isso que nos prende: a consciência, que não deixa a responsabilidade falhar e nossos desejos e anseios são cada vez mais procrastinados.
Você não adora aquelas histórias de casais que fogem? Vai me dizer que nunca quis encontrar alguém que mexesse tanto com você que tivesse vontade de ir embora? Eu tive um namorado, a gente só se via no final de semana. Brincávamos dizendo que íamos fugir... Eu gostava de dizer que íamos para uma comunidade alternativa na Amazônia, ele ia pescar e eu ia tocar flauta de bambu. Teríamos cinco filhos e nunca mais a gente ia ter que se falar pelo telefone, pois estaríamos à distância de um grito. Mas... e se tudo der errado? Se aparece uma morena mais bonita que eu e ele resolve me deixar sozinha com os cinco moleques? Ou se a gente não dá conta do recado e acaba passando fome? Minha vó diz que “quando a fome bate na porta, o amor pula pela janela.” Hum... ainda dá pra virar hippie. Tentador não?
Um dia desses fui comprar brinco na rodoviária e o cara me convidou pra ir com ele pro Paraná na próxima semana. Disse que ia lá vender seus brincos e que tinha acabado de chegar do nordeste... Até me deu um friozinho na barriga de vontade. Meus amigos dizem que se eu não fosse mórmon seria hippie! Heheh provável que fosse mesmo...
Mas acho interessante como essas pessoas “metem as caras”! Um dos meus instrutores do circo veio a pé do Chile! Acabou arrumando emprego aqui, mas essa semana me confessou: “Já tem três meses que estou em Brasília, estou doido pra ir conhecer o Atlântico!”. Muita coragem...
Quanta coragem de investir vale o seu sonho?
Quero bolsa para estudar na Bolívia, passar férias no México e aprender a dançar tango na Argentina. Tomar chocolate quente no Rio Grande do Sul e subir o litoral do Brasil de carro na minha lua de mel. Sei que meu sonho custa bem uns 3 meses de férias e o salário de uns 10 anos, mas quem disse que eu vou casar antes dos 40? Talvez meu sonho mesmo, e sei que muito de vocês compartilham dele, seja só encontrar O cara, para depois começar a sonhar de novo...
“Você não tá entendendo quase nada do que eu digo,
Eu quero é ir-me embora, eu quero é dar o fora!
E quero que você venha comigo...”
Morena - mai/06
Eternamente "tios"
Um dia desses saí pra caminhar e passei enfrente a um dos colégios que freqüentei. Era final de turno e quando alguns funcionários passaram por mim, reconheci dentre eles um a quem carinhosamente nos referíamos como o tio da portaria. Sebastião o nome dele, sempre que eu o cumprimentava, balançava a cabeça em sinal afirmativo e dizia “tudo bem Naiara”. Fiquei feliz em revê-lo. Acredito que esses tios não têm idéia de como são importantes na nossa vida...
Lembrei da tia Justina, e dos tantos papos que a gente batia no portão da escola esperando alguém me buscar. Era bom saber que tinham adultos legais, e engraçado que em 90% dos casos, esses eram os tios.
E o Ataíde? Esse era o guarda de uma outra escola. Eu devia estar na 2ª série primária e todos os dias depois da aula a gente ia jogar vôlei, queimada ou futebol. Ele era o nosso juiz permanente, nenhum jogo começava se ele não estivesse lá pra comandar. Até arrumou um apito. Quantas crianças você conhece que imploram para adultos “se meterem” em seus jogos? E quantos adultos você conhece dispostos a, todos os dias e muitas vezes depois do horário, apitar brincadeira de moleque?
Depois me lembro de quantas vezes vi crianças pequenas gritando com esses nossos tios... Não posso entender... Grande parte da minha formação se deu em razão dessas pessoas, sempre ali de bom humor! Nem eram eles que te davam dever de casa, te expulsavam de sala ou chamavam seus pais para conversar! Alô! Eles são os adultos legais! Desvalorizados, que ficavam cuidando da gente enquanto ninguém vinha buscar, levando pra “salinha” e ainda correndo atrás dos mais danados, pra no outro dia ainda ouvir de relance: “Vocês não vão acreditar! Ontem eu fui embora pra casa e a tia Conceição não me pegou!” Eles eram definitivamente os únicos adultos legais do planeta. Quantas vezes nos ajudavam a esconder, ou davam gargalhadas das nossas piadinhas sem graça? E ainda te chamavam pelo nome e sorriam sempre que te viam.
Cícero era o nome do tio da cantina que me deixava comprar fiado. Só eu tinha esse privilégio, porque um dia ele me deu R$0,50 a mais e eu devolvi. Ele me ensinou que através da honestidade a gente pode conquistar confiança e amizade.
E as tias da limpeza? Me lembro bem de uma ruiva, nunca soube o nome dela, mas lembro que estava sempre de cabeça baixa. Um dia resolvi dar “bom dia”, ao que ela respondeu com um sorriso. Desde aí nunca mais a vi olhando pra baixo, ela sempre me via quando eu passava e sorria. Faz pouco tempo a encontrei no ponto de ônibus. Eu cresci, tracei meus caminhos e agora tenho meus próprios interesses, preocupações e responsabilidades... Nada disso fez diferença alguma pra ela, porque não só me reconheceu como sorriu da mesma maneira de antes. E fez mais, quis saber como eu estava e o que na minha vida havia mudado. Ela me ensinou que amizades podem ser simples, desde que sejam sinceras. Como meu “bom dia” e o sorriso dela.
Consegue contar quantas vezes um bedel livrou sua cara? Me lembro sempre do tio Ribas, acho que ele era o favorito do pessoal. Teve muita revolta na escola quando ele foi embora... Não dá pra esquecer também do Alan, que a gente acreditava ser possuidor de uma bola de cristal. Era incrível como ele sempre estava no lugar e na hora certas pra pegar alguém em flagrante. A gente se divertia fantasiando a quantidade de clones que ele devia ter rodando pelo colégio... Fora o Zequinha, que foi tombado (literalmente), pelos meninos como patrimônio de outro dos tantos colégios por onde passei.
Esses tios foram especiais pra mim, e pode acreditar, pra muitos dos meus amigos também. Nos ensinaram em sua simplicidade, muitos dos princípios que hoje guiam nossa vida por um mundo sem valores. São eles que ficam gravados na nossa memória e são os primeiros a serem reconhecidos quando encontrados no decorrer da vida. Junto com a professora da 4ª série e aquele outro de inglês do 2º grau, eles têm um lugar especial no nosso coração. Tente se lembrar dos seus tios e procure perceber quantas coisas essenciais aprendeu com eles. Ainda vai deixar seus filhos maltratarem a tia que cuida da sua casa?
Morena – mar/06
Lembrei da tia Justina, e dos tantos papos que a gente batia no portão da escola esperando alguém me buscar. Era bom saber que tinham adultos legais, e engraçado que em 90% dos casos, esses eram os tios.
E o Ataíde? Esse era o guarda de uma outra escola. Eu devia estar na 2ª série primária e todos os dias depois da aula a gente ia jogar vôlei, queimada ou futebol. Ele era o nosso juiz permanente, nenhum jogo começava se ele não estivesse lá pra comandar. Até arrumou um apito. Quantas crianças você conhece que imploram para adultos “se meterem” em seus jogos? E quantos adultos você conhece dispostos a, todos os dias e muitas vezes depois do horário, apitar brincadeira de moleque?
Depois me lembro de quantas vezes vi crianças pequenas gritando com esses nossos tios... Não posso entender... Grande parte da minha formação se deu em razão dessas pessoas, sempre ali de bom humor! Nem eram eles que te davam dever de casa, te expulsavam de sala ou chamavam seus pais para conversar! Alô! Eles são os adultos legais! Desvalorizados, que ficavam cuidando da gente enquanto ninguém vinha buscar, levando pra “salinha” e ainda correndo atrás dos mais danados, pra no outro dia ainda ouvir de relance: “Vocês não vão acreditar! Ontem eu fui embora pra casa e a tia Conceição não me pegou!” Eles eram definitivamente os únicos adultos legais do planeta. Quantas vezes nos ajudavam a esconder, ou davam gargalhadas das nossas piadinhas sem graça? E ainda te chamavam pelo nome e sorriam sempre que te viam.
Cícero era o nome do tio da cantina que me deixava comprar fiado. Só eu tinha esse privilégio, porque um dia ele me deu R$0,50 a mais e eu devolvi. Ele me ensinou que através da honestidade a gente pode conquistar confiança e amizade.
E as tias da limpeza? Me lembro bem de uma ruiva, nunca soube o nome dela, mas lembro que estava sempre de cabeça baixa. Um dia resolvi dar “bom dia”, ao que ela respondeu com um sorriso. Desde aí nunca mais a vi olhando pra baixo, ela sempre me via quando eu passava e sorria. Faz pouco tempo a encontrei no ponto de ônibus. Eu cresci, tracei meus caminhos e agora tenho meus próprios interesses, preocupações e responsabilidades... Nada disso fez diferença alguma pra ela, porque não só me reconheceu como sorriu da mesma maneira de antes. E fez mais, quis saber como eu estava e o que na minha vida havia mudado. Ela me ensinou que amizades podem ser simples, desde que sejam sinceras. Como meu “bom dia” e o sorriso dela.
Consegue contar quantas vezes um bedel livrou sua cara? Me lembro sempre do tio Ribas, acho que ele era o favorito do pessoal. Teve muita revolta na escola quando ele foi embora... Não dá pra esquecer também do Alan, que a gente acreditava ser possuidor de uma bola de cristal. Era incrível como ele sempre estava no lugar e na hora certas pra pegar alguém em flagrante. A gente se divertia fantasiando a quantidade de clones que ele devia ter rodando pelo colégio... Fora o Zequinha, que foi tombado (literalmente), pelos meninos como patrimônio de outro dos tantos colégios por onde passei.
Esses tios foram especiais pra mim, e pode acreditar, pra muitos dos meus amigos também. Nos ensinaram em sua simplicidade, muitos dos princípios que hoje guiam nossa vida por um mundo sem valores. São eles que ficam gravados na nossa memória e são os primeiros a serem reconhecidos quando encontrados no decorrer da vida. Junto com a professora da 4ª série e aquele outro de inglês do 2º grau, eles têm um lugar especial no nosso coração. Tente se lembrar dos seus tios e procure perceber quantas coisas essenciais aprendeu com eles. Ainda vai deixar seus filhos maltratarem a tia que cuida da sua casa?
Morena – mar/06
Sem dinheiro e sem preço
Faz pouco tempo numa aula na UnB, uma das minhas professoras estava indignada a respeito de programas como “Amigos da Escola” e outros semelhantes.
Segundo ela, essa é a definição pura de assistencialismo, onde tem-se o pai de um aluno fazendo um trabalho que alguém deveria ser pago para fazer. Pensei no que ela falou e concordei em parte. Alguém fazendo de graça tira o emprego de outro, mas por outro lado, você, eletricista, vai deixar faltar luz na escola do seu filho porque o governo não paga ninguém para resolver um problema muitas vezes simples? Complicado não?!
Voltei a prestar atenção na revolta dela, que só ia se expandindo, até chegar no limite:
“Ninguém tem tempo de fazer trabalho voluntário”
Não pude acreditar no que acabara de ouvir. Pensei que tivesse me distraído e perdido o contexto em que aquela frase veio inserida.
Ela continuou, pegou um garoto como exemplo e começou a perguntar qual a rotina dele. Este descreveu uma vida atarefada e ela repetiu: “Ninguém tem tempo de fazer trabalho voluntário”. Como se não bastasse, continuou defendendo sua colocação, disse que não podia se dar ao luxo de gastar os minutos precisos que estaria com seus filhos, fazendo trabalho voluntário. Disse ainda que esse tipo de atividade não enche barriga de ninguém, e outras atrocidades que me deixaram completamente chocada. Quis gritar, agora quem estava indignada era eu! Até hoje não sei porque não o fiz, talvez a passividade e apatia com que meus colegas escutavam aquilo tenham me deixado paralisada.
“Ninguém tem tempo de fazer trabalho voluntário”
Posso aceitar que muitas pessoas não o façam por realmente acharem que não tem tempo, por acreditarem que sempre existirá alguém para fazê-lo ou qualquer coisa do gênero. Mas, propaganda “abaixo o trabalho voluntário” foi demais pra mim. Será que somos tão egoístas a ponto de deixar crianças morrendo pelas ruas, idosos apodrecendo tristes em asilos e não temos um segundo para agradecer o Pai Celestial por todas as coisas que possuímos? Será que somos tão miseráveis de espírito que não podemos fazer doações simples a uma instituição de caridade? Quem já visitou um asilo ou orfanato ao menos uma vez, sabe que qualquer coisa serve. Se você não tem dinheiro, pode dar livros, se não tem livros, pode dar brinquedos, roupas que não usa mais ou o seu carinho, seu tempo de um dia. Não precisa passar o dia todo nem ir 3 vezes por semana e é também uma boa atividade em família. Tenho uma tia que todos os anos quando vem ao Brasil leva seus filhos num orfanato e diz “É pra eles aprenderem que tem gente que precisa das coisas mais do que a gente, e sempre lembrarem de serem gratos por tudo o que têm”.
Já faz algum tempo que estou procurando um lugar onde possa compartilhar minha música, confesso que se estivesse realmente procurando já teria achado, mas caiu no meu colo a oportunidade de fazer uma oficina num abrigo infantil. Estou empolgadíssima para ir lá e quando chamei um amigo para me ajudar, achando que ele ia fazer corpo mole, fiquei surpresa quando a resposta veio:
“Vamos sim Ná, a gente pode combinar de ir num sábado, uma vez por mês pra ensinar música pra essas crianças, pra gente poder também pagar tudo o que Papai do Céu faz pela gente...”
Eu tive vontade de chorar. As pessoas precisam de nós e se alguém acredita que a gente não recebe pagamento, está muito enganado. Meu irmão é escoteiro, e dedica suas sextas-feiras à noite distribuindo sopa. Todas as semanas ele vai. Alguém acredita que ele e os amigos dele fazem isso sem receber nada em troca? Sinceramente eu não acredito.
Daí alguém pode me dizer que já tentou fazer algo do tipo e não ouviu nem um “obrigado” ou pior, ainda ouviu um palavrão ou algo semelhante. Somos todos seres humanos, cheios de falhas e, portanto incapazes de julgar. Garanto que dentro do coração daquela pessoa ela foi grata por você se importar.
Ouvi uma história uma vez, de um garoto que jogava bola perto da casa de uma senhora. Todas as vezes que a bola caía dentro de seu terreno, ela pegava e nunca mais devolvia. Um dia esse menino estava limpando a calçada da frente de sua casa das folhas que caíam e percebeu que a dela também estava suja. Ele disse que nem ele mesmo sabe porque, mas limpou a calçada dela. E assim, todos os dias que limpava sua própria casa, limpava a dela. Um dia quando foi sair para brincar, ela o chamou e disse que há muito tempo ninguém se importava com ela como ele se importou. Pediu desculpas por seu mau-humor devolvendo todas as bolas e chamando ele pra tomar chá com biscoito.
Naquele dia, aquele garoto ganhou uma amiga. Acham que isso é não receber nada? Chegar em casa, deitar a cabeça no travesseiro e saber que hoje você fez algo realmente importante para alguém, hoje, você foi muito mais que um ser autômato que levanta, trabalha, come e volta pra casa. Hoje você expandiu suas fronteiras e pensou grande, fez um bem para a humanidade e, quem sabe amanhã não é você que está precisando de ajuda? Porque “a caridade nunca falha”. E você, está esperando o quê
Morena – mar/06
Segundo ela, essa é a definição pura de assistencialismo, onde tem-se o pai de um aluno fazendo um trabalho que alguém deveria ser pago para fazer. Pensei no que ela falou e concordei em parte. Alguém fazendo de graça tira o emprego de outro, mas por outro lado, você, eletricista, vai deixar faltar luz na escola do seu filho porque o governo não paga ninguém para resolver um problema muitas vezes simples? Complicado não?!
Voltei a prestar atenção na revolta dela, que só ia se expandindo, até chegar no limite:
“Ninguém tem tempo de fazer trabalho voluntário”
Não pude acreditar no que acabara de ouvir. Pensei que tivesse me distraído e perdido o contexto em que aquela frase veio inserida.
Ela continuou, pegou um garoto como exemplo e começou a perguntar qual a rotina dele. Este descreveu uma vida atarefada e ela repetiu: “Ninguém tem tempo de fazer trabalho voluntário”. Como se não bastasse, continuou defendendo sua colocação, disse que não podia se dar ao luxo de gastar os minutos precisos que estaria com seus filhos, fazendo trabalho voluntário. Disse ainda que esse tipo de atividade não enche barriga de ninguém, e outras atrocidades que me deixaram completamente chocada. Quis gritar, agora quem estava indignada era eu! Até hoje não sei porque não o fiz, talvez a passividade e apatia com que meus colegas escutavam aquilo tenham me deixado paralisada.
“Ninguém tem tempo de fazer trabalho voluntário”
Posso aceitar que muitas pessoas não o façam por realmente acharem que não tem tempo, por acreditarem que sempre existirá alguém para fazê-lo ou qualquer coisa do gênero. Mas, propaganda “abaixo o trabalho voluntário” foi demais pra mim. Será que somos tão egoístas a ponto de deixar crianças morrendo pelas ruas, idosos apodrecendo tristes em asilos e não temos um segundo para agradecer o Pai Celestial por todas as coisas que possuímos? Será que somos tão miseráveis de espírito que não podemos fazer doações simples a uma instituição de caridade? Quem já visitou um asilo ou orfanato ao menos uma vez, sabe que qualquer coisa serve. Se você não tem dinheiro, pode dar livros, se não tem livros, pode dar brinquedos, roupas que não usa mais ou o seu carinho, seu tempo de um dia. Não precisa passar o dia todo nem ir 3 vezes por semana e é também uma boa atividade em família. Tenho uma tia que todos os anos quando vem ao Brasil leva seus filhos num orfanato e diz “É pra eles aprenderem que tem gente que precisa das coisas mais do que a gente, e sempre lembrarem de serem gratos por tudo o que têm”.
Já faz algum tempo que estou procurando um lugar onde possa compartilhar minha música, confesso que se estivesse realmente procurando já teria achado, mas caiu no meu colo a oportunidade de fazer uma oficina num abrigo infantil. Estou empolgadíssima para ir lá e quando chamei um amigo para me ajudar, achando que ele ia fazer corpo mole, fiquei surpresa quando a resposta veio:
“Vamos sim Ná, a gente pode combinar de ir num sábado, uma vez por mês pra ensinar música pra essas crianças, pra gente poder também pagar tudo o que Papai do Céu faz pela gente...”
Eu tive vontade de chorar. As pessoas precisam de nós e se alguém acredita que a gente não recebe pagamento, está muito enganado. Meu irmão é escoteiro, e dedica suas sextas-feiras à noite distribuindo sopa. Todas as semanas ele vai. Alguém acredita que ele e os amigos dele fazem isso sem receber nada em troca? Sinceramente eu não acredito.
Daí alguém pode me dizer que já tentou fazer algo do tipo e não ouviu nem um “obrigado” ou pior, ainda ouviu um palavrão ou algo semelhante. Somos todos seres humanos, cheios de falhas e, portanto incapazes de julgar. Garanto que dentro do coração daquela pessoa ela foi grata por você se importar.
Ouvi uma história uma vez, de um garoto que jogava bola perto da casa de uma senhora. Todas as vezes que a bola caía dentro de seu terreno, ela pegava e nunca mais devolvia. Um dia esse menino estava limpando a calçada da frente de sua casa das folhas que caíam e percebeu que a dela também estava suja. Ele disse que nem ele mesmo sabe porque, mas limpou a calçada dela. E assim, todos os dias que limpava sua própria casa, limpava a dela. Um dia quando foi sair para brincar, ela o chamou e disse que há muito tempo ninguém se importava com ela como ele se importou. Pediu desculpas por seu mau-humor devolvendo todas as bolas e chamando ele pra tomar chá com biscoito.
Naquele dia, aquele garoto ganhou uma amiga. Acham que isso é não receber nada? Chegar em casa, deitar a cabeça no travesseiro e saber que hoje você fez algo realmente importante para alguém, hoje, você foi muito mais que um ser autômato que levanta, trabalha, come e volta pra casa. Hoje você expandiu suas fronteiras e pensou grande, fez um bem para a humanidade e, quem sabe amanhã não é você que está precisando de ajuda? Porque “a caridade nunca falha”. E você, está esperando o quê
Morena – mar/06
Sob as asas da imaginação
Hoje entrei numa comunidade nova no orkut: “Eu sofro de imaginação”. Até o momento, nunca me ocorrera que eu “sofresse” disso.
Sofrer de imaginação... Isso é uma doença grave que atinge grande parte da população mundial e que agora me parece clara! Sabe todos aqueles surtos numas situações nada a ver? Aqueles dramas que te tiram horas de sono e enchem baldes de lágrimas? São apenas os sintomas dessa patologia!
Einstein diz que imaginação é mais importante que conhecimento. Eu diria que da fusão desses dois elementos nasce o Macgiver, o único ser capaz de arrombar uma porta usando uma lâmpada, um cano e um cubo de gelo. (???) Ok, mas e quanto a imaginação pura, simples? Aquela que usamos no dia-a-dia e nos relacionamentos com as pessoas? Aquela imaginação substituta do conhecimento, que abre brechas para frases do tipo “não é nada do que você está pensando”, que em 90% dos filmes, é EXATAMENTE o que o personagem estava pensado...
Já passou por aquelas situações chamadas “mal entendidos”? Como uma vez que a correntinha de um amigo meu prendeu no meu brinco enquanto ele se despedia de mim. Foram filmados em torno de 10 segundos da cena: o rosto dele a uns 2 cm de distância do meu, eu sorrindo, ele fazendo “carinho” no meu pescoço e uma música lenta de fundo. As pessoas que assistiram a filmagem tinham certeza que ele tinha colocado um chifre público na namorada. Ainda bem que eu estava presente na primeira exibição da fita... já pensou?
Às vezes fico viajando em como seria bom poder ler o pensamento das pessoas, desde criança esse sempre foi o meu sonho de “super poder”. E adivinha? O Pink, não é tão burro quanto parece! Tem um episódio que a gente assiste de dentro da cabeça dele, então dá pra entender porque ele fala aquelas atrocidades para o Cérebro quando este pergunta: “Pink, você está pensando o mesmo que eu?” O Pink, sofre do mal da imaginação fértil e veloz! Enquanto o Cérebro segue por uma linha reta e racional constituída de início, meio e fim, o Pink deixa a imaginação dele ir para onde ela bem entender! Se ele vê algo interessante ou lembra de alguma coisa, a imaginação dele flutua sobre as barreiras da lógica e pousam suavemente no hipopótamo cor-de-rosa de calção de banho.
EUREKA! Será que todos os loucos, dramáticos, alucinados, ciumentos do mundo apenas sofrem desse mal? E eu, por também ser portadora dessa doença sem cura, tenho imensas razões para crer que quem padece dessa enfermidade, sofre muuuuuito mais... A imaginação cria asas, tanto para o bem quanto para o mal! E se você está entendendo exatamente o que eu estou falando, é porque já ganhou um beijo tão gostoso que te fez pensar em casamento, filhos, bodas de prata, ouro etc. Com certeza já esperou um goiaba que estava atrasado 3 horas, imaginando que ele estava sentado na parada de ônibus quando foi atingido por uma bala perdida e que agora está caído no asfalto, ainda com o gibi na mão, e com os miolos escorrendo junto com o sangue para dentro da boca-de-lobo...
Qualquer coisa fora da rotina chama a atenção de um Maníacusalucinantius imaginativus, (esse é o nome científico da doença), qualquer coisa nova pode ser motivo de um trauma ou um surto. Cuidado! Não é de propósito, e nem é culpa nossa, se vocês nos dão espaço para imaginar! Não é culpa nossa se a casinha está tão longe que a gente vai ter que andar quilômetros imaginando a reação do dono quando for importunado, no meio da noite, por um moribundo que furou o pneu e agora precisa de um maldito macaco! (a piada do cara do macaco... é a minha favorita!), e se vocês têm a oportunidade de não serem mandados para o inferno, façam isso! Ajudem no tratamento de uma doença tão cruel!
Então, se você sempre chamou aquela garota para dançar, hoje, você vai olhar para ela e vai chamá-la dessa vez como de todas as outras! Porque se você deixar ela lá sentada te esperando e tentando descobrir o que está errado, na próxima festa, quando resolver falar com ela, corre o risco de ouvir palavrões em até 10 idiomas diferentes...
Ou ainda, se você tem um amigo de verdade, conte que você está namorando, ou que vai se casar! Essas são notícias supostamente boas, mas que podem vir a ser catastróficas, especialmente se seu amigo for um caso da versão mais grave da doença: Maníacusalucinantius imaginativus barraqueirus. Aí, meu amigo, se prepare! Você é o culpado por uma crise sem proporções definidas de um desses enfermos... Isso pode gerar conseqüências seríssimas! Desde caixas de lenço de papel amontoadas ao lado da cama a ingestão de remédios controlados. E aí? Vai pagar pra ver?
Disso tudo acho que todos nós podemos tirar uma grande lição: somos todos seres humanos, diferentes na forma de pensar, agir e sentir. Somos agraciados com o livre-arbítrio, que nos permite tomar nossas próprias decisões. Mas é importante lembrar que não podemos viver sozinhos e que nossas decisões particulares afetam sim as pessoas a nossa volta e, se nos importamos com elas não daremos espaço para a imaginação correr solta. Não que se deva dar satisfações ao mundo, mas as pessoas que amamos podem ser magoadas devido às falhas de comunicação. Porque o silêncio, ao contrário do que pode parecer, diz muito.
Naiara Gonçalves de Almeida – dez/05
20 anos blues
Não sei quantos de vocês compartilham da opinião de que existem dias, datas específicas, em que se é obrigado a parar pra pensar na vida. Particularmente, acredito que essas datas se resumam ao primeiro dia de cada ano e ao dia do aniversário. A primeira, cheia de promessas do porvir e a segunda remetendo a anos passados...
No dia de hoje eu, Naiara Gonçalves de Almeida, do sexo feminino, brasileira, solteira estou começando a terceira década da minha vida. Sinceramente não acho motivo para comemoração. Talvez antigamente tivesse, pensando no sentido de se ter sobrevivido a mais um ano. Afinal, ali pela idade média, seguindo alguns séculos depois, e... tudo bem, em alguns lugares até os dias de hoje, as doenças sem cura são tantas que a taxa de mortalidade, principalmente infantil, é coisa de se arrepiar os cabelos. Daí tem que comemorar mesmo, velhice é artigo de luxo.
“Hoje de manhã quando acordei, olhei a vida e me espantei... eu tenho mais de 20 anos...”
Logo de manhã quis voltar correndo pros 18... assim até parece que estão longe, ou que é possível. Na verdade é só porque 18 anos é a idade entre dois mundos, é quando você tem o universo nas mãos, onde pode ser tudo sem ter que ser nada. Agora é diferente, a partir de hoje não sou mais uma “teenager”.
“Eu tenho mais de mil perguntas sem respostas...”
Hoje é meu aniversário e cheguei a me perguntar algumas vezes se meu namorado teria sequer ligado se o orkut não começasse a avisar com uma semana de antecedência. Aliás, quantos mais se lembrariam? Talvez seja até uma maneira (precária, concordo), de se separar as pessoas para as quais nós fazemos alguma diferença. Hum... Agora começa a fazer sentido para mim a ânsia de algumas pessoas pelos telefonemas...
Meu aniversário. Não devia ter algo mágico nesse dia? Só consigo pensar que agora ajudo a compor a parcela da população com mais de 20 anos desempregada. E não só essa, mas também da que ainda vai demorar um booom tempo pra conseguir se formar e já passou dos 20...
Será que é só isso? A famosa “crise dos 20” que me atingiu? “Eu era feliz e não sabia?”. Sabia, sabia sim. Sei. E todo mundo pode saber.
“Os homens sofreriam menos se não se concentrassem tanto (...) na lembrança dos seus males, em vez de esforçar-se por tornar o presente suportável” Goethe
É isso! Sou feliz quase 90% do ano, portanto me reservo o direito de ter um dia, em meio aos 364 outros, só pra lembrar que do último ano pra cá o mundo só está cada vez pior...
“Eu tenho mais de 20 muros,
O sangue jorra pelos furos, pelas veias de um jornal...
Eu não te quero, eu te quero mal!”
A sorte é que não acaba aqui. Ainda existem aquelas pessoas, aqueles amigos que te acordam 7h da manhã fazendo serenata de Roberto Carlos, aqueles mesmos que com certeza acordaram antes do sol nascer e vieram de bem longe pra te dar um beijo porque é seu aniversário. E porque é seu aniversário, te trazem uma cesta cheia de coisas gostosas e assinam uma abóbora invés de um cartão;
A sorte é que existem aquelas pessoas que riem de você porque está despenteada e toda babada, mas não se importam em te encher de beijos mesmo que você ainda nem tenha escovado os dentes;
A sorte é que você tem seus pais, ou alguém que faça o papel deles, para te ligar um monte de vezes por dia para saber se está tudo bem, e te comprar o que quiser para comer.
A sorte, é que a sua melhor amiga, não se importa que você odeia fazer aniversário, e assim mesmo faz um escândalo no telefone e te convence a ir comer crepe, só você e ela. Porque o que é importante, não é a comemoração, ou a festa. O importante é estar com você... e afinal, hoje o seu é de graça né?!
Sorte que existem os seus amigos da aula de dança que se acotovelam pra tirar você pra dançar primeiro, e que te matam de rir com as suas piadinhas.
Sorte que existem os namorados pra te ligar... na verdade sorte dele ter ligado.
Sorte que você tem um melhor amigo que trabalha até tarde da noite, mas que não se esquece de você, mesmo que seja pra mandar uma mensagem do tipo “HÁ... VELHA... heuheu te amo”.
Ainda bem que existem essas pessoas para enfeitar dias tão feios. Talvez seja isso... Talvez agora eu tenha finalmente entendido “o espírito do aniversário” e percebido que por isso se comemora: Para que um momento chato da sua vida se torne um pouquinho mais encantador. E, o que seria de nós sem os amigos?
“Essa calma que inventei, bem sei
custou as contas que contei
eu tenho mais de vinte anos...”
Morena - mai/05
"É tudo free"
Essa semana fiquei lendo até tarde da noite, quando fui dormir reparei que estava chateada...
A história do livro é sobre uma prostituta que aparentemente (é que ainda não acabei de ler), se apaixona por um de seus clientes. Como o livro foi escrito a mais de duzentos anos, o tipo de relacionamento dos dois era algo próximo de um namoro, levando em consideração que burguês não trabalha; e por isso passavam tardes inteiras conversando.
Mas como assim uma mulher, na condição dela, pode se apaixonar e ainda mais por um cliente? Obviamente que ela não poderia se dar a esses luxos não é? Afinal ela não é um ser humano, é apenas um bem de consumo. Como seu amante a define, não tão friamente, por certo, e como diz um amigo meu “não vejo mulheres nelas, só vejo produtos”. Fiquei triste. Muito na verdade. Ultimamente estou tendo um contato que considero grande com esse tipo de coisa, devido a dois livros da minha leitura obrigatória de curso e também ao fato do meu namorado morar na 914, de vez em quando me distraio e passo pela comercial da 314 sem me lembrar do que vou ver por lá...
“Só vejo produtos”. Até que ponto nós não fazemos parte disso e não nos tornamos consumidores ou mesmo os próprios produtos? Colocando agora numa visão geral, até que ponto nós estamos fora desse antro? Tenho uma professora na UnB que faz questão de dizer todas as aulas que ganha R$ 1170,00 como professora substituta. Eles exigem mestrado pra isso... Ao meu ver isso nada mais é que prostituição do conhecimento, o que me lembra nitidamente do meio musical. Sempre ouço isso na Escola de Música quando faço a pergunta: “E aí? Fazendo o quê da vida?” A resposta vem rasgando: “Me prostituindo numa banda de pagode” ou algo semelhante.
Tenho uma banda baile com uma baixista e um batera “metaleiros”, meu negócio é MPB e o violeiro é chegado numa modinha caipira... “todo artista tem que ir aonde o povo está”...
Sem contar os beijos que tanta gente vende nos “showzinhos” por aí em troca de se sentir especial por alguns instantes, ou apenas para dizer “fiquei com 10!” para se provar atraente ou algo do gênero. Ou ainda pior! Namoros intermináveis onde se vendem um alto índice de carinhos para se comprar atenção. Por vezes chega a ser uma troca fria e calculista. Acredite! Esses tempos descobri que realmente existe gente assim... felizmente acredito no potencial que as pessoas têm de mudar. E quem sou eu para julgar?
Estava indignada pensando nisso... Como em algum ponto somos todos “prostitutos da existência”, e isso realmente estava me matando! Como de repente tudo pra mim parecia um grande comércio infame de compra e venda de valores. Foi aí que entrei num ônibus, um zebrinha para ser exata, e reparei que o motorista dava “bom dia” a cada uma das pessoas que entrava. Algumas sorriam, outras nem respondiam, mas ele insistentemente cumprimentava cada uma delas e sorria.
Cheguei perto da roleta e fiquei esperando chegar minha parada. Ele me olhou pelo espelho, sorriu e disse gentilmente “oi!” Sorri de volta e perguntei como ele estava. Me disse que estava tudo bem e puxou assunto, fazendo piadinhas sobre o dinheiro que separava enquanto dirigia. Um espírito muito grande.
Peguei ônibus com ele mais uma ou duas vezes, e ele sempre do mesmo jeito atencioso e alegre. Foi a resposta para minha revolta de outrora. Podemos dar abraço, atenção, carinho... “tudo free” e assim distribuir felicidade com nosso sorriso. Alguém que simplesmente conduzia o meio de transporte que eu utilizara naquela manhã fez meu dia mais feliz. A partir daí acreditei mais ainda na capacidade que as pessoas têm de mudar, e de, a partir daí, fazer as coisas que se tem que fazer com gosto e colocando amor no que fazem. Uma das minhas professoras de literatura diz que tudo que se lê sem amor, é leitura perdida. Eu generalizaria isso: tudo o que se faz sem amor é tempo perdido, e ergo a seguinte bandeira:
“Abaixo a qualquer forma de prostituição”... E você?
Morena - abr/05
Encontros e desencontros (na verdade mais desencontros)
Não sei se isso é exatamente um problema que envolve mais que uma porcentagem mínima de 0,0001% da população mundial dessas últimas décadas, mas, meu amigo, você já reparou em como é difícil achar um namorado? Affffff! Não sei se isso é azar ou se é incompetência mesmo, mas quantas vezes você já não viu esse mesmo filme?
Solteiríssima,vida maravilhosa! Volta a sair com as amigas toda oportunidade que tem, paquera os gatinhos, fala abobrinha… Sem compromisso! E canta bem alto: “don’t tell me what to do, don’t tell me what to say” dançando sozinha no quarto com uma lata de guaraná na mão. AH! E finalmente vai assistir “o diário da princesa II” o ex nunca quis ver com você… Livre!!!
Depois continua a sair com as amigas, mas sente falta de umas duas porque saíram com o namorado. Quase te consola o fato de estar usando aquela calça massa que o falecido odiava. Mas já começa a sentir falta de receber e-mails e mensagens no celular dizendo coisas fofas sobre você.
Daí numa bela sexta-feira à noite, você já comeu uma caixa de bombons e está jogada na frente da televisão assistindo “Aladdin” pela milionésima vez. Quando finalmente chega aquela parte que a Jasmin diz “Ele, eu escolho ele!”, e beija o Aladdin, você começa a chorar inconsolavelmente.
Antes de se jogar na cama e chorar até dormir de cansaço (ou morrer de dor de cabeça, o que vier primeiro), você vai ao banheiro e acaba por se olhar no espelho. Daí repara em como fica horrível de olhos vermelhos e com o nariz escorrendo. É aí que vem o perigo: hora de começar tudo de novo…
Analisar o espaço amostral, escolher o alvo, mirar e atirar. Até que o reconhecimento do terreno é divertido, principalmente se você tem uma amiga na mesma situação pra fazer os devidos comentários. Agora depois… affffff!
Uma vez saí com um cara, amigo de uma amiga minha (já viu né?!) Papo legal, me levou pra conhecer a cidade, abriu a porta do carro, me deu o casaco etc. Já tinha colocado o olho na mira… Até que ele me manda um e-mail pedindo desculpas por não ter me dado “uns beijinhos” (????)
Quem nunca passou pela situação típica de finalmente encontrar o cara massa, preparar a escopeta, mirar e quando vai atirar, ele vira praquela sua amigona e chama ela pra sair? Nota metal: Arrumar uma amiga bem baranga.
Também tem aquele dia, quando você vê o cara, acha ele tudo de bom e dá um jeito de saber quem ele é. O cara é gente fina, charmoso e tal e você já está programando como vai fazer pra sair com ele quando acontece: Ele penteia o cabelo com os dedos e você vê… enorme e brilhante aquele pneuzão na mão esquerda. O remédio é rir, rir muito! Eu me odeio!
Mas ainda é vantagem quando você descobre sozinha, porque o pior de tudo é o fora… a dor de cotovelo, nó! Uma amiga minha me contou uma dessas situações típicas já citadas que o garoto que ela gosta, gosta da amiga dela. Acabaram as duas chorando juntas até de madrugada. Bah que deprê! Só me lembra uma vez que eu e a minha prima dividimos uma toalha pra enxugar as lágrimas…
Essa coisa de ser brasileira também é dose! Os estrangeiros acham que a gente é topa qualquer negócio. Eu, na minha condição de mulher sou naturalmente seletiva e ainda residindo fora do país, me sinto até no dever de ser ainda mais né?! Daí me vem o cabra, me viu duas vezes na vida, está todo mundo assistindo filme, ele me espreme contra o braço do sofá e deita no meu ombro. Sem contar que bateu na minha bunda com o saco de pipoca. Fiquei chocada. O que será que ele pensava que estava fazendo?
Fora quando a gente ri com feijão no dente, quando senta no chão e o cofrinho aparece, quando fala aquela besteira que nem sabe de onde veio… E a gente vai vivendo, até achar outro mané arriado os quatro pneus por você ou pior: você por ele. Pra namorar e descobrir que é um goiaba ou simplesmente que não era o cara certo.
E a gente vai assim, dando murro em ponta de faca, como diz um amigo meu: Enquanto não acha o certo, vai se divertindo com os errados.
Nessas horas eu penso que talvez os macacos é que sejam felizes...
Morena - nov/04
Solteiríssima,vida maravilhosa! Volta a sair com as amigas toda oportunidade que tem, paquera os gatinhos, fala abobrinha… Sem compromisso! E canta bem alto: “don’t tell me what to do, don’t tell me what to say” dançando sozinha no quarto com uma lata de guaraná na mão. AH! E finalmente vai assistir “o diário da princesa II” o ex nunca quis ver com você… Livre!!!
Depois continua a sair com as amigas, mas sente falta de umas duas porque saíram com o namorado. Quase te consola o fato de estar usando aquela calça massa que o falecido odiava. Mas já começa a sentir falta de receber e-mails e mensagens no celular dizendo coisas fofas sobre você.
Daí numa bela sexta-feira à noite, você já comeu uma caixa de bombons e está jogada na frente da televisão assistindo “Aladdin” pela milionésima vez. Quando finalmente chega aquela parte que a Jasmin diz “Ele, eu escolho ele!”, e beija o Aladdin, você começa a chorar inconsolavelmente.
Antes de se jogar na cama e chorar até dormir de cansaço (ou morrer de dor de cabeça, o que vier primeiro), você vai ao banheiro e acaba por se olhar no espelho. Daí repara em como fica horrível de olhos vermelhos e com o nariz escorrendo. É aí que vem o perigo: hora de começar tudo de novo…
Analisar o espaço amostral, escolher o alvo, mirar e atirar. Até que o reconhecimento do terreno é divertido, principalmente se você tem uma amiga na mesma situação pra fazer os devidos comentários. Agora depois… affffff!
Uma vez saí com um cara, amigo de uma amiga minha (já viu né?!) Papo legal, me levou pra conhecer a cidade, abriu a porta do carro, me deu o casaco etc. Já tinha colocado o olho na mira… Até que ele me manda um e-mail pedindo desculpas por não ter me dado “uns beijinhos” (????)
Quem nunca passou pela situação típica de finalmente encontrar o cara massa, preparar a escopeta, mirar e quando vai atirar, ele vira praquela sua amigona e chama ela pra sair? Nota metal: Arrumar uma amiga bem baranga.
Também tem aquele dia, quando você vê o cara, acha ele tudo de bom e dá um jeito de saber quem ele é. O cara é gente fina, charmoso e tal e você já está programando como vai fazer pra sair com ele quando acontece: Ele penteia o cabelo com os dedos e você vê… enorme e brilhante aquele pneuzão na mão esquerda. O remédio é rir, rir muito! Eu me odeio!
Mas ainda é vantagem quando você descobre sozinha, porque o pior de tudo é o fora… a dor de cotovelo, nó! Uma amiga minha me contou uma dessas situações típicas já citadas que o garoto que ela gosta, gosta da amiga dela. Acabaram as duas chorando juntas até de madrugada. Bah que deprê! Só me lembra uma vez que eu e a minha prima dividimos uma toalha pra enxugar as lágrimas…
Essa coisa de ser brasileira também é dose! Os estrangeiros acham que a gente é topa qualquer negócio. Eu, na minha condição de mulher sou naturalmente seletiva e ainda residindo fora do país, me sinto até no dever de ser ainda mais né?! Daí me vem o cabra, me viu duas vezes na vida, está todo mundo assistindo filme, ele me espreme contra o braço do sofá e deita no meu ombro. Sem contar que bateu na minha bunda com o saco de pipoca. Fiquei chocada. O que será que ele pensava que estava fazendo?
Fora quando a gente ri com feijão no dente, quando senta no chão e o cofrinho aparece, quando fala aquela besteira que nem sabe de onde veio… E a gente vai vivendo, até achar outro mané arriado os quatro pneus por você ou pior: você por ele. Pra namorar e descobrir que é um goiaba ou simplesmente que não era o cara certo.
E a gente vai assim, dando murro em ponta de faca, como diz um amigo meu: Enquanto não acha o certo, vai se divertindo com os errados.
Nessas horas eu penso que talvez os macacos é que sejam felizes...
Morena - nov/04
Pedro Pedreiro
Ultimamente estou tendo muito tempo livre para pensar nas coisas, o que me leva a um ponto interessante: por que hoje em dia é tão difícil encontrar Aristóteles, Platões, Shakespeares e outros como eles? A resposta agora me parece simples: eles tinham tempo de sobra para ficar, como diz Adriana Flacão em um de seus livros infantis, “pensando pensamentos”, ou inventando problemas para as soluções existentes. Acredito que tenham dito uma porcentagem altíssima de abobrinhas, mas em compensação, das coisas que se salvaram é que descende a base da nossa cultura e história ocidental.
Em fim, agora cá estou, mais uma vez sem nada melhor pra fazer, analisado uma música do Chico Buarque que só um dia desses parei pra escutar. Aliás não se preocupem que vou mandar todos os meus momentos filosóficos para vocês, quem sabe eu não consiga achar alguém que me pague para eu passar o dia pensando? Pagam pro Paulo Coelho!
Quem me conhece um pouco, musicalmente falando, sabe que para mim o Chico Buarque é um dos maiores poetas da Música Popular Brasileira, e chego até a dizer que é um gênio. Pena que as pessoas hoje em dia não o conheçam mais. Aliás, quem vê assim tem certeza que eu tenho pelo menos mais de 25 anos... Isso me faz lembrar de um amigo, ele tem por volta de 35, e diz ser bem mais novo que eu. Segundo ele, eu só ouço “velharia”.
De qualquer maneira, eu tinha acabado de escrever uma canção, alguma coisa que tive a pretensão de classificar como chorinho, sobre o fato das pessoas estarem sempre esperando por algo. Foi aí que notei esse samba do Chico (repara na intimidade “Chico”), mais exatamente numa frase em que ele fala “esperando aumento desde o ano passado para o mês que vêm”. Fiquei triste. A gente espera tempo demais para ser feliz. Espera muito por algo e não faz nada para consegui-lo. Como diz minha mãe, “espera que o mundo acabe em barranco para morrer encostado”.
Outra frase que me chamou atenção logo de cara foi quando ele diz: “E a mulher de Pedro está esperando um filho para esperar também”, como um ciclo extremamente monótono. Mas ao mesmo tempo quando alguém espera por algo, é porque sente aquela coisinha lá no fundo que as pessoas chamam de Esperança. Afinal, viver não é um jogo simples e a acomodação é sutil. Ele fala disso também: “Pedro pedreiro fica assim pensando, assim pensando o tempo passa e a gente vai ficando pra trás”.
Dessa forma, temos um paradoxo: Por um lado, não dá pra ficar parado, e como diria o grande Raul Seixas, “eu é que não me sento no trono de um apartamento com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar”. Essa frase é um tapa na cara das pessoas que não fazem nada para melhorar de vida e ainda ficam enchendo os ouvidos das outras dizendo dia após dia: “Ser pobre é uma desgraça!”
Por outro lado, as pessoas precisam de esperança e daquela palavrinha que está sempre subentendida quando se fala disso: Sonho. Quem somos nós se não podemos sonhar? Só que como o Chico é “o” cara, ele também levou isso em consideração quando disse que “Pedro não sabe, mas talvez no fundo espere alguma coisa mais linda que o mundo, maior do que o mar”. Essa é a essência do ser humano. Mas aí vem o final da frase: “mas pra que sonhar se dá o desespero de esperar demais?”. É aí que a gente volta para o início de tudo onde Pedro pedreiro, como todos os dias, está esperando o trem. Todos os sonhos, a esperança e também a música, foram apenas segundos de pensamentos perdidos.
“Pedro Pedreiro quer voltar atrás,
Quer ser pedreiro, pobre e nada mais, sem ficar
Esperando, esperando, esperando, esperando o sol,
Esperando o trem, esperando aumento para o mês que vem,
Esperando um filho pra esperar também,
Esperando a festa, esperando a sorte,
Esperando a morte, esperando o Norte
Esperando o dia de esperar ninguém,
Esperando enfim, nada mais além
Que a esperança aflita, bendita, infinita do apito de um trem”
Morena - out/04
"Ser ou não ser?"
Você sabe o que exatamente quer dizer “ser adulto”? Se você tem 40 anos é um adulto? Acredito conhecer muitas pessoas que chegam nessa idade e ainda estão “adolescendo”.
Meu violeiro me definiu “adulto” como sendo uma pessoa que é capaz de pagar suas próprias contas sem depender dos pais. Então conheço adultos de 16 anos e adolescentes de 30... Acredito, no entanto, que a maioria das pessoas diria que se tratam de pessoas “maduras”.
Pensando nisso, cheguei a algumas conclusões interessantes aqui, como por exemplo a de que eu nunca vou ser completamente adulta. Depois de uma pesquisa de opinião sobre maturidade, posso dizer que esta significa:
Não se importar muito com nada (quando não envolve dinheiro);
Achar que tudo vai acabar bem;
Nunca dar escândalos;
Nunca tirar satisfações, só deixar pra lá;
Ouvir com atenção quando as pessoas querem desabafar;
Sempre sorrir e falar com todo mundo;
Deixar as coisas sempre claras, ser sincero;
Ter responsabilidade com os compromissos assumidos;
Divertir-se com moderação;
Desabafar superficialmente e para no máximo um amigo;
Sempre pedir desculpas, não importa quem começou;
Sempre saber o que quer.
Tenho 19 anos e acho que, como a maioria das pessoas que estão nessa faixa etária, surge a grande dúvida: “Ser ou não ser? Eis a questão!”. E aqui vai minha resposta: Ser e não ser.
Faz algumas semanas, me hospedei num hotel com minha tia, e a ouvi fazendo as reservas: “Não, ela não é adulta”. Isso me pôs para pensar... Em junho passado viajei para Campinas e cada tostão que gastei saiu do meu bolso. Essa semana estou indo para o Arizona e a passagem, mais uma vez, saiu do meu bolso. Sou adulta sim, com minha própria vida e meus compromissos; minhas decisões e minhas responsabilidades.
Por outro lado, um dia desses tivemos um jantar aqui em casa para eu ser apresentada a um garoto... homem... (viu só?!) Em fim, ser apresentada a essa pessoa que gostariam que eu conhecesse. Lá pelas tantas, meu primo e o irmão mais novo dele, resolveram montar a cama elástica no quintal. Só que meu primo e o outro menino têm 15 anos, ou seja, legalmente eles podiam brincar (lembra da regra número 9?). Subi para trocar de blusa e quando voltei, estavam o Steven (motivo do jantar), e outro irmão de idade próxima conversando civilizadamente ao lado da cama elástica. Passei por eles correndo e comecei a pular com os meninos. De repente, parece que os dois se esqueceram que eram adultos (o outro deles inclusive está noivo), e como cinco crianças nós estávamos pulando e gritando. As máscaras caíram. Ninguém é adulto de verdade.
Diante disso, aqui vai o meu protesto:
NÃO SOU E NEM QUERO SER ADULTA!!!
Quero ser respeitada pelas responsabilidades que tenho e por ser capaz de cumprir os compromissos que assumo, quero ouvir quando um amigo quer desabafar e não ter que dizer “vai acabar tudo bem”, porque eu me importo! Quero o direito de chorar quando estou triste e de ficar com raiva, Shakespeare diz que “se você está com raiva, tem o direito de estar com raiva, mas isso não lhe dá o direito de ser cruel”. É isso! Quero ter o direito de perder uma pessoa querida e me trancar no quarto por um dia inteiro sem ter que provar para ninguém que sou forte, porque não sou. Sou humana. Quero o direito de amar as pessoas e não querer me casar! E isso não tem nada a ver com a minha suposta “maturidade”, ou simplesmente com o fato de saber ou não o que quero para minha vida. Todo mundo sabe o que quer, mas as pessoas têm o direito de mudar de idéia! Li numa revista que uma pessoa demoraria 100 anos para assimilar todas as novidades que acontecem no mundo em um dia. Quem sou eu para ter certeza do que quero fazer daqui a 5 anos? Daqui a 10 anos vou ter 29 e ainda vou estar muito nova!
Quero o direito de me importar com os outros e de contar para todos os meus amigos que estou triste, quero me afastar de quem não me faz bem e brincar na piscina de bolinhas (às vezes os guardas do shopping deixam a gente entrar), sem ninguém me olhar como se fosse um E.T., além de dançar como bem entender e dar gargalhada quando está tudo uma droga.
Estou sendo radical? Só quero poder viver e ser feliz, sair, jogar bola com os garotos (aqui é bom porque os americanos são perna de pau que só, estou sendo estrela!). Não quero ter 20 anos de idade, um bebê no colo e outro agarrado na barra da saia como estou vendo muito por aqui... Foi escolha delas, acredito que sejam felizes assim, mas eu não! Quero estudar, trabalhar, jogar imagem e ação debaixo do bloco e ficar batendo papo até altas horas da noite (mas sem jogo da verdade porque ninguém merece). Entende? Não quero fingir que sou madura, como a maioria das pessoas. É fácil ser assim, tenho 12 regrinhas para me ajudar na encenação, só que não me importo com elas. Ninguém é maduro de verdade. Não dá só para deixar as máscaras caírem?
Como já disse, quero ser respeitada por ter responsabilidade, mas não quero que as pessoas fiquem me dizendo “Nossa! Você me impressionou agora, isso foi muito maduro!” como algumas vezes acontece. Não tenho mais 13 anos, posso tomar minhas próprias decisões, assumir as conseqüências delas e ser feliz ao mesmo tempo. Não posso?
Morena - set/04
Meu violeiro me definiu “adulto” como sendo uma pessoa que é capaz de pagar suas próprias contas sem depender dos pais. Então conheço adultos de 16 anos e adolescentes de 30... Acredito, no entanto, que a maioria das pessoas diria que se tratam de pessoas “maduras”.
Pensando nisso, cheguei a algumas conclusões interessantes aqui, como por exemplo a de que eu nunca vou ser completamente adulta. Depois de uma pesquisa de opinião sobre maturidade, posso dizer que esta significa:
Não se importar muito com nada (quando não envolve dinheiro);
Achar que tudo vai acabar bem;
Nunca dar escândalos;
Nunca tirar satisfações, só deixar pra lá;
Ouvir com atenção quando as pessoas querem desabafar;
Sempre sorrir e falar com todo mundo;
Deixar as coisas sempre claras, ser sincero;
Ter responsabilidade com os compromissos assumidos;
Divertir-se com moderação;
Desabafar superficialmente e para no máximo um amigo;
Sempre pedir desculpas, não importa quem começou;
Sempre saber o que quer.
Tenho 19 anos e acho que, como a maioria das pessoas que estão nessa faixa etária, surge a grande dúvida: “Ser ou não ser? Eis a questão!”. E aqui vai minha resposta: Ser e não ser.
Faz algumas semanas, me hospedei num hotel com minha tia, e a ouvi fazendo as reservas: “Não, ela não é adulta”. Isso me pôs para pensar... Em junho passado viajei para Campinas e cada tostão que gastei saiu do meu bolso. Essa semana estou indo para o Arizona e a passagem, mais uma vez, saiu do meu bolso. Sou adulta sim, com minha própria vida e meus compromissos; minhas decisões e minhas responsabilidades.
Por outro lado, um dia desses tivemos um jantar aqui em casa para eu ser apresentada a um garoto... homem... (viu só?!) Em fim, ser apresentada a essa pessoa que gostariam que eu conhecesse. Lá pelas tantas, meu primo e o irmão mais novo dele, resolveram montar a cama elástica no quintal. Só que meu primo e o outro menino têm 15 anos, ou seja, legalmente eles podiam brincar (lembra da regra número 9?). Subi para trocar de blusa e quando voltei, estavam o Steven (motivo do jantar), e outro irmão de idade próxima conversando civilizadamente ao lado da cama elástica. Passei por eles correndo e comecei a pular com os meninos. De repente, parece que os dois se esqueceram que eram adultos (o outro deles inclusive está noivo), e como cinco crianças nós estávamos pulando e gritando. As máscaras caíram. Ninguém é adulto de verdade.
Diante disso, aqui vai o meu protesto:
NÃO SOU E NEM QUERO SER ADULTA!!!
Quero ser respeitada pelas responsabilidades que tenho e por ser capaz de cumprir os compromissos que assumo, quero ouvir quando um amigo quer desabafar e não ter que dizer “vai acabar tudo bem”, porque eu me importo! Quero o direito de chorar quando estou triste e de ficar com raiva, Shakespeare diz que “se você está com raiva, tem o direito de estar com raiva, mas isso não lhe dá o direito de ser cruel”. É isso! Quero ter o direito de perder uma pessoa querida e me trancar no quarto por um dia inteiro sem ter que provar para ninguém que sou forte, porque não sou. Sou humana. Quero o direito de amar as pessoas e não querer me casar! E isso não tem nada a ver com a minha suposta “maturidade”, ou simplesmente com o fato de saber ou não o que quero para minha vida. Todo mundo sabe o que quer, mas as pessoas têm o direito de mudar de idéia! Li numa revista que uma pessoa demoraria 100 anos para assimilar todas as novidades que acontecem no mundo em um dia. Quem sou eu para ter certeza do que quero fazer daqui a 5 anos? Daqui a 10 anos vou ter 29 e ainda vou estar muito nova!
Quero o direito de me importar com os outros e de contar para todos os meus amigos que estou triste, quero me afastar de quem não me faz bem e brincar na piscina de bolinhas (às vezes os guardas do shopping deixam a gente entrar), sem ninguém me olhar como se fosse um E.T., além de dançar como bem entender e dar gargalhada quando está tudo uma droga.
Estou sendo radical? Só quero poder viver e ser feliz, sair, jogar bola com os garotos (aqui é bom porque os americanos são perna de pau que só, estou sendo estrela!). Não quero ter 20 anos de idade, um bebê no colo e outro agarrado na barra da saia como estou vendo muito por aqui... Foi escolha delas, acredito que sejam felizes assim, mas eu não! Quero estudar, trabalhar, jogar imagem e ação debaixo do bloco e ficar batendo papo até altas horas da noite (mas sem jogo da verdade porque ninguém merece). Entende? Não quero fingir que sou madura, como a maioria das pessoas. É fácil ser assim, tenho 12 regrinhas para me ajudar na encenação, só que não me importo com elas. Ninguém é maduro de verdade. Não dá só para deixar as máscaras caírem?
Como já disse, quero ser respeitada por ter responsabilidade, mas não quero que as pessoas fiquem me dizendo “Nossa! Você me impressionou agora, isso foi muito maduro!” como algumas vezes acontece. Não tenho mais 13 anos, posso tomar minhas próprias decisões, assumir as conseqüências delas e ser feliz ao mesmo tempo. Não posso?
Morena - set/04
Ele, o pai e elas
Ele sentou-se no meio da rua e começou a chorar. Tudo o que desejava era não ter estado ali e nem ter ouvido o que ouviu. Como era possível? A foto datava de 1945 e na lembrança só lhe vinham as conversas com o pai sobre a maneira peculiar que Ela tinha de preparar o chá. Como poderia aquilo tudo ser verdade? Ele enxuga as lágrimas e chama um táxi. Ajeita a pequena mala no banco traseiro e se senta ao lado. Lágrimas ainda lhe percorrem o rosto enquanto diz:
- Para o aeroporto por favor.
O motorista puxa assunto e vez por outra ele responde com um monossílabo qualquer, mas seu pensamento está distante, repassando diversas vezes a cena que vivera momentos atrás:
- Lamento que você tenha descoberto tudo dessa maneira... não era para ser assim... me perdoe!
A luz forte do aeroporto interrompe seus pensamentos perdidos e ele desce do carro. Paga o táxi e vai em busca de seu destino.
- 1945... - repete ele baixinho - como é possível que fosse ela?
- Existem muito mais verdades na vida do que as em que estamos dispostos a acreditar. - fala uma voz por cima do ombro Dele.
- Pai?! Mas... o que você está fazendo aqui? Como sabia onde me encontrar?
- Ela me ligou chorando quando você saiu, imaginei que estaria aqui. Fugindo! Como sempre...
- Então você sabe porque... Você sabia o tempo todo?
- Desculpe, mas como é que eu ia te contar? Você estava feliz, Ela estava feliz... para que saber?
- Mas como?
- Eu a reconheci. Ela e sua avó eram muito amigas. Ela teve que me contar.
- Isso não pode estar acontecendo... eu tenho que ir.
- Espere! Deixe-me explicar...
- O avião estava atrasado duas horas e mesmo assim o pai não parecia se aproximar de uma conclusão.
- Então ela se apaixonou por mim quando eu a atendi no hospital? Mas ela estava delirando! A beira da morte!
- Sim, mas foi só aí que ela pôde reconhecê-lo! Só então ela o identificou... sua alma gêmea!
- Isso é ridículo. - disse ele, articulando bem os lábios como se seu pai os tivesse lendo.
- Não seja cético meu filho! Dê uma chance a você mesmo e ao sentimento que cresce no seu peito! Vocês querem ficar juntos e...
- Pai, ela morreu!
- Mas voltou! Jovem, bonita e... e o chá que ela faz? Igualzinho ao da sua avó...
- Escuta o que você está falando! Essa mulher tem 95 anos! E está morta! Isso é impossível! E você está a duas horas falando, mas não disse nada!
Nesse momento parece que o pai perde a cabeça e por um instante parece não pensar no que diz:
- Você não conhece a Morte! - As palavras do pai ecoam no ar... Ele, que já estava de costas, vira-se novamente e não acredita no que ouve.
- Você não conhece a Morte! - repete o pai com os olhos arregalados. - Você não a conhece! Linda, carinhosa, de vermelho... a Morte não é como dizem. - mais calmamente o pai continua - ela é colorida e tudo ao seu redor também fica quando ela se aproxima... parece... parece um anjo! Mas seu olhar profundo não deixa esconder quem ela realmente é. - neste momento o pai olha para baixo e parece buscar coragem para emitir a próxima frase:
- Eu também voltei... Por você. Por sua mãe. Milagres não existem. O que existe é o amor... e a Morte.
- Mas... mas como?
- Não dá para explicar... isso é entre você e ela. Entre cada um de nós e ela.
- Tá bom, pra mim já chega. Isso tudo é demais para a minha cabeça. Eu vou embora.
- Então você vai deixa-La sofrer por uma vida inteira outra vez?
Ele emudeceu. Seus olhos novamente se encheram de lágrimas. Ele olhou o pai com carinho, como se assim pudessem se comunicar, secou o rosto e partiu.
Morena - ago/08
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